segunda-feira, 6 de abril de 2009

Amada fortaleza de concreto esverdeado.

O pouco sol do dia nublado entrava pela janela do ônibus e aquecia meu corpo. Meus olhos ardiam, sentia sono. Apoiei minha cabeça de lado na janela para descansar um pouco e vi uma longa fila de carros à nossa frente.

Quando o ônibus finalmente andou, passamos por uma loja de roupas com uma vitrine relativamente grande, andamos mais um pouco e empacamos novamente, agora na frente do cemitério. Vontade de descer do ônibus e caminhar um pouco, respirar um pouco de ar puro, ainda que este ar tivesse “cheiro de morte”.

O ônibus parou novamente, desta vez na frente do colégio onde completei o ensino fundamental. Fechei os olhos para pensar... Saudades daquele lugar. Minha história, minha personalidade, minhas maiores alegrias e também minhas decepções nasceram e cresceram dentro daquela ilha de concreto esverdeado no meio da cidade. Não era um lugar bonito, pelo contrário, parecia mais uma penitenciária do que um colégio. Havia dois portões principais: Um para a quadra (que só era aberto para a saída de alunos) e um que dava para uma pequena janela na secretaria onde pais de alunos eram atendidos. Passando disso, uma enorme porta de madeira branca e vidros velhos (que foi trocada à uns 2 anos por uma porta de aço branca, aparentemente blindada).

Passando disso o pátio central com bancos de concreto se despedaçando. Paredes verdes, que pareciam vivas nos dias ensolarados (que ocorriam aproximadamente 7 vezes por ano) e úmidas nos dias nublados (bem mais comuns por aqui) . Na parte superior do prédio que já tinha mais de 50 anos, um corredor com umas 10 salas com capacidade cada uma para mais ou menos 45 alunos cada uma. Em uma ponta do corredor uma pequena biblioteca, à qual somente os melhores alunos (em nota) tinham acesso. Na outra extremidade do corredor um pequeno depósito e um laboratório precário. Tudo verde.

Na parte inferior: Biblioteca (que todos podiam freqüentar), banheiros, refeitório, sala de educação física (onde eram guardados os equipamentos de ginástica, e que tinha ao fundo o pequeno vestiário aposentado à mais de 20 anos, com apenas dois chuveiros); Logo a frente disso, podíamos ver a quadra. Apesar de terem se passado quase 4 anos desde a época em que estudei lá, consigo me lembrar de quase tudo, fora é claro, momentos de tristeza mais profundos que eu fiz questão de apagar de minha mente.

Um dia que eu nunca esquecerei: Estava milagrosamente fazendo sol, e as pessoas pareciam naturalmente mais alegres por isto. Estava sentada na arquibancada da quadra principal. A brisa leve fazia meu cabelo dançar... Eu contemplava maravilhada a paisagem que se formava em volta de mim; O chão estava coberto por flores amarelas do pé de Ipê. As pessoas andavam pisando sobre elas, afastando-as com os pés. Havia crescido grama em torno das raízes da majestosa árvore. Havia até borboletas, coisa incomum de se ver por aqui. O vento fazia as flores se desprenderem das árvores e caírem sobre minha cabeça, como uma dádiva dos céus. Veio perto de mim então, aquele garoto que era minha grande paixão na época. Um amor inocente; Pegou uma das flores que pairavam no ar e colocou-a na minha mão... um gesto de imensurável carinho. Eu sorri, ele correspondeu com um sorriso também e saiu sem dizer nada. Eu fiquei parada, simplesmente curtindo o momento.

Mal sabia eu que aquele mesmo garoto seria, anos mais tarde, personagem principal do pesadelo que se tornara minha vida . Desencostei a cabeça do vidro, abri os olhos e percebi que já estava longe, nas proximidades do colégio onde estudo atualmente. O impacto com a realidade no qual vivo agora, deixou bem claro o quanto minha vida se tornou amarga. O vento agora não me traz flores, mas sim arrasta comigo os cacos de minhas lembranças que eu tento deixar para trás. O mundo parece cada dia mais cinzento aqui fora. Bem diferente da minha amada fortaleza de concreto verde, que permanecerá eternamente em meus sonhos.

2 comentários:

Utopia disse...

Parabéns, vc conseguiu transformar uma coisa decadente como o nosso velho e desgastado colégio em algo poético e memorável!!!! Amei o texto, acho que partir de agora lembrarei dos velhos tempos com mais saudades do que nunca!!!!

Jabuti disse...

Rsrs, eu lembro todos os dias com pesar por ter deixado o tempo escapar pelas fendas de meus dedos e feliz por toda experiência que trouxe de lá. Era um lugar mágico, sem descrição, decadentemente memorável, um tipo de poesia gasta que nunca acaba como uma música boa em um Cd riscado, repete, repete, mas não deixa de ser maravilhoso. O "Lar" das alegrias "eternamente efêmeras".