sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Yara, 2009

Malas feitas, abraço apertado, de volta pra casa, sem papel e sem caneta.
Dor de cabeça, mar agitado.
Céu azul.
Sabor de decadência, amargo de saudade e de longe uma centelha de esperança de ouvir uma voz conhecida depois de tanto tempo... Depois de tanto tempo poder ter um segundo de compreensão e um ombro amigo, talvez mais que isso...
Yara deixou a pequena bolsa no banco de trás e saiu em passos pequenos, as mãos buscavam alento e os olhos algum sinal de vida.
- De longe o carro parece um brinquedo... tudo pode parecer um brinquedo - Disse com as pontas dos pés já próximos da beira da ponte enquanto se sentava. Estava com as pernas cansadas. Sentada, sentia-se melhor. A dor era menor, respirava com mais facilidade, via tudo com uma perspectiva melhor. Com a pequena carteira nas mãos procurava fotos, mas só encontrou pouco dinheiro, papéis em branco e uma caixa pequena de grafites.
Alguns minutos depois um ônibus passou, e o motorista curioso, porém cheio de receio parou para descobrir o motivo de um carro parado no acostamento, próximo a ponte, com uma das portas abertas e sem ninguém por perto, mas era tarde demais. Yara já havia abraçado a fantasia que a fazia respirar melhor, ou não ter de se preocupar com isso.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Insônia

Matei você esta noite. Na verdade é o que eu gostaria de fazer. Te esperei desolada, em meio a copos vazios e esperanças arruinadas mas só ví seu fantasma.
Três meses atrás te ví num campo escuro cheio de armadilhas, a beira de um abismo...
Ontem abracei teu diário, juntei seus restos e os meus desfeitos em pedaços pequenos pra tentar montar um quadro novo, mas acho que eles só são úteis como coadjuvantes, para dar um pouco de brilho a pinturas alheias.
Três meses atrás eu confundi sua voz com o vento, tão suave que ela era... no dia seguinte joguei meu cinzeiro fora, mas eu só sei que você não apareceu mais porque volta e meia tenho que limpar minha escrivaninha para jogar as cartelas de comprimidos no lixo, ou refazer meus curativos sozinha, de novo.
Mas agora já sei o que fazer quando você aparecer. Vou afastar esses copos que estão em cima da sua foto e sussurrar com sua voz de vento: "Não, não fuja não, finja que agora eu era seu brinquedo"

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Ode ao amor


Você, com essa besteira de querer me fazer acreditar no futuro
De adorar dar tiro no escuro
Tenho que te dizer que pra mim a única coisa mais preciosa que o oxigênio, é o chão firme abaixo de meus pés

Com toda a loucura de dizer que quer voar, tocar o céu, jogar as responsabilidades ao léu
De se dizer inconstante mas não volúvel
Despreocupado, fútil
sozinho
Inútil.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Devaneios

Eu ainda sentia um pouco de dor, mas a ajuda de todas as pessoas próximas de mim fazia com que tudo parecesse mais leve. Devagar abri meus olhos e então percebi porque sentia frio. Chamei por uma enfermeira, e pedi que me trouxesse um cobertor. Esta, perguntou-me então se eu me sentia bem para receber visitas. Respondi com um sonoro ‘é claro’. Sabia que estava mal mas até então não havia parado para pensar no que minha aparência demonstrava. 
A visita, como nos últimos meses, era minha mãe, que parecia cada dia mais triste e cansada. Nunca foi meu intuito tornar a vida dela assim tão mórbida, no entanto, era realmente assim que ela estava. Decidi então, no que eu julguei ser um dos momentos de maior sensatez de toda minha vida, compartilhar com ela um desejo...

- Quero me casar

Ela assentiu sem dizer nada e saiu do quarto. Fiquei confusa com o que tivesse sido que ela houvesse pensado, e passei até mesmpo a questionar o que eu realmente havia dito, pois seu rosto não demostrou nenhuma emoção. Aquela altura, já sabíamos o desfecho supostamete trágico de minha história, ao menos era assim que os outros viam e julgavam: Tragédia... “Partir assim tão nova, sem ter realizado nenhum sonho...”

Eu, obviamente enxergava isso de uma maneira mais leve, e por mais assustador que pudesse parecer ao resto do mundo, estava realmente feliz, como aliás, nunca estive...
A mesma enfermeira voltou perguntando novamente se eu estava disposta a receceber visitas. Me olhava com pena e isso realmente já estava me irritando. A contragosto, respondi que sim e
pensei quem poderia ser. Minhas amigas, do tempo do colégio...

- E como você está? - Perguntava uma delas com um sorriso falso, afagando com muito cuidado meu ombro, numa tentativa atrapalhada de ser solidária
- Ah... enfim alguém que realmente se importe pergunta isso. Estou muito bem, muito feliz - respondi com todo o entusiasmo que ainda me restava apesar dos constantes aborrecimentos com a enfermeira. Dei o sorriso mais caloroso que pude.

Minha melhor amiga, chorava desde o momento em que entrou no quarto. Estava inconsolável e não conseguia disfarçar... Eu simplesmente não compreendia o motivo. Ficamos todas em silêncio por mais um tempo até que a mesma enfermeira veio perguntar-me se eu me sentia bem para receber visitas. Eu respondi novamente de cara fechada que sim, então ela pediu que as meninas saíssem para que minha mãe pudesse entrar. Veio com uma sacola grande, branca, dessas de lojas de vestidos caros. A princípio não entendi, depois colocou a caixa sobre minhas pernas....

-          Abre... Sei que você vai gostar. Infelizmente hoje não poderei ficar a tarde com você, tenho algumas coisas para fazer para seu irmão e também correr atrás da papelada. Chamei suas amigas. Sei que vai ficar bem... Creio que ele chegará logo, se não esta semana, ao menos ainda este mês... Você quer escrever a carta?
-          Se a senhora puder fazer isto por mim mãe...
-          Farei. Por favor descance. Adeus

Falava monotonamente, parecia exausta.
Deu-me um beijo no rosto e saiu.

Quando abri a caixa mal pude acreditar. Era, de fato o vestido de noiva mais lindo que eu ja tinha visto, e parecia ter feito sob medida para mim, como eu há muito sonhara.
A mesma enfermeira irritante se aproximou para perguntar novamente se eu estava em condições de receber visitas, desta vez eu não tinha nem como tentar ser antipática com ela, pedi que me levasse a um lugar onde pudesse me ajudar a me vestir, que depois, receberia quem ela quisesse. Os olhos praticamente escreviam em seu rosto o que ela pensava... Que eu parecia louca. Talvez há uns dois anos atrás esse tipo de pensamento ainda me preocupasse de alguma forma, mas agora... eu de fato não me importava.

Estava feliz demais para tentar revidar.

Apesar de muito bonito, era feito de um tecido leve e permitia que eu me movimentasse bem e ficasse na cama de maneira confortável, sem mais muitas preocupações

As meninas entraram novamente no quarto, e nenhuma delas conseguia disfarçar o fato de que acreditavam que eu havia enlouquecido de vez.
A minha alegria era tamanha, que até perguntei para minha melhor amiga:
Mas afinal de contas por que você está chorando? – disse sorrindo
Ela respondeu suspirando e tentando engolir o choro, com toda a sinceridade que sua tristeza não contida permitia:
-          Porque você vai morrer – Ela disse se demorando muito na última palavra.

Aquela frase me assustou a princípio, e fez com que eu me sentisse por alguns segundos estranha, mas em seguida, fiquei ainda mais feliz, processando a informação agora com um pouco mais de realismo
            O silêncio no quarto agora era mortal, e as outras garotas pareceram de repente se darem conta daquilo que tentavam não enxergar desde que haviam chegado ali, todas começaram a chorar da maneira mais silenciosa que podiam.

-          Sim, e vou me casar!! não é maravilhoso?! – respondi em seguida, quase saltando da cama

Todas me olharam incrédulas, e , como eu imaginava, me pediram explicações

-          Mas como isso? Por que? Por que isso agora? O que você está pensando? E com quem afinal de contas?
-          Bem, irei me casar, porque é um sonho que quero realizar. Nnca me importei muito com isso para ser bem sincera, mas agora escuto a todo momento todos dizendo que eu tenho pouco tempo, então , gostaria de fazer isto logo, antes que “meu tempo passe” como todo mundo diz.

Todas continuaram em silêncio

-          E eu não acho loucura nenhuma – disse isso dessa vez um pouco irritada – Sei que nenhuma de vocês disse isso diretamente, mas pelas caras de vocês imagino o que estão pensando.
-          Mas com quem? Com quem? Com quem? – disse minha melhor amiga, pressionando a cabeça com as duas mãos e andando nervosa de um lado para outro.
-          Com  um amigo meu – respondi sorrindo – Ele está viajando mas logo irá voltar. Minha mãe irá escrever uma carta para ele, e assim que receber ele irá voltar, virá e nós iremos nos casar. Espero que dê tempo – disse esta última frase pensando em quanto tempo ele levaria para receber a carta

As garotas perceberam que, apesar de estar feliz eu precisava descansar. Se despediram em um tom melancólico e aturdidas com aquela novidade. Em menos de cinco minutos eu me ví só. Logo adormeci. Minha melhor amiga, a quem eu carinhosamente chamarei de chorona, passou a me visitar sempre que podia, e sempre estávamos conversando, desta maneira eu me sentia logicamente mais feliz, com menos dor e o tempo parecia passar mais rápido.

Tres dias se passaram e então minha mãe me trouxe uma carta, nela, ele dizia que compreendia meus motivos e que em pouco tempo estaria chegando. Minha felicidade estava completa. A chorona então neste momento perguntou:

-          Faz muito tempo que vocês se gostam? Quer dizer... você nunca me falou sobre ele, vocês chegaram a namorar muito tempo antes de você ser internada?
-          Não, nós nunca nos gostamos – eu respondi rindo – Não ao menos desta maneira, sempre fomos somente bons amigos, e , acredito que continuaremos assim. Ele por ser um amigo tão especial vai me ajudar a realizar este desejo. Eu nunca estive tão feliz minha amiga, eu mal posso acreditar que vou me casar, e... morrer!

Neste momento ela começou a chorar de maneira silenciosa novamente. Ninguém conseguia entender que ao menos para mim, aquilo era sinônimo de alegria, nem eu em outro momento compreenderia. Eu só sabia o que sentia e digo com toda a sinceridade que nunca tive tanta paz.

Como dito na carta , dois dias depois ele chegou. Era uma linda manhã de quarta -feira, ensolarada, de céu azul. Eu já estava vestida, aguardando somente que ele chegasse. Estava muito bonito, em um terno alinhado, parecia um pouco triste, mas em seus olhos eu via que ele compreendia minha felicidade. Disse que eu estava radiante, e aquilo só me fez sorrir ainda mais, algumas lágrimas principiaram a cair, pela alegria que eu sentia, no entanto, as contive sem muito esforço. Temia que todos pensassem que eu chorava de tristeza, que eu transparecesse algo que não estava sentindo. Minha alegria era tamanha que eu tinha vontade de levantar da cama e dançar pelos corredores do hospital. Logo o juiz chegaria para realizar a cerimônia. Meu noivo então, pacientemente sentou-se ao meu lado, segurou a minha mão, e ficamos conversando, por alguns longos minutos. Cerca de meia hora havia se passado até que um médico entrou no quarto

-          Senhorita Leda?
-          Sim – respondi surpresa
-          Me desculpe, não tinha visto seu marido, Senhora Leda.
-          Não, não se desculpe – respondi rindo -  Ainda não nos casamos, mas o juiz chegará logo.
-          Ah, sim, tudo bem – Ele respondeu fingindo que estava entendendo – Pois bem senhorita Leda, quantos anos você tem?
-          Vinte – Respondi me ajeitando na cama, sem entender absolutamente nada
-          Então acredito que posso dar a notícia diretamente a você. Você, bem... como poderei dizer isto
-          Diga logo, por favor – Meu noivo disse um tanto quanto nervoso, apertando minha mão. Creio que ele temia que eu tivesse menos tempo do que imaginávamos
-          Devo lhe dizer que, bem. Você foi diagnosticada com uma doença que não possui, houve uma falha por parte do hospital, alguns exames foram trocados – Neste momento meu noivo sorria e eu estava chocada,  boquiaberta
-          Você deve estar com o sistema imunológico fragilizado por ter recebido um tratamento do qual não necessitava, mas, devo lhe dizer que ao contrário do que pensávamos, você não corre nenhum risco, e creio que em breve receberá alta.

No momento em que ele pronunciou essas ultimas palavras minha mãe entrou com minhas amigas e o juíz no quarto. E foi uma seção de abraços pra cá, risos pra lá e eu me sentia ainda mais perdida. Perguntaram me se eu não desejava adiar o casamento, para que pudéssemos fazer uma festa e assim celebrarmos também aquela grande e supostamente maravilhosa notícia. Eu simplesmente não conseguia pensar.

As coisas giravam lentamente ao meu redor e tentando me levantar da cama percebi que o chão havia sumido por debaixo dos meus pés. Assim que consegui me recuperar e me sentar na cama novamente comecei a chorar desesperada, soluçando ruidosamente. Somente alguns minutos depois, em meio a toda aquela euforia, perceberam que eu não estava bem,e perguntaram então o que eu sentia

-          Não sei, não é justo!! Não é justo! Não é isso o que eu quero para mim. Não quero mais casamento, não quero mais nada... – Disse afundando lentamente meu rosto no travesseiro enquanto eu tentava gritar e minha voz sumia, desejando com todas as forças do meu coração que aquela última notícia do médico fosse somente mais um um erro.

 Enquanto todo aquele desgosto tomava conta de mim as imagens que se passavam em minha cabeça pareciam em câmera lenta. Percebi que minha mãe conversava com o médico procurando saber quando eu poderia ir embora e ví que eu já estava me levantando da cama, saindo do quarto e andando em direção a porta do hospital. Descalça, com o vestido branco, falso noivo a tira colo e chorando como uma criança. Desta maneira, me afogando em minhas gotas de tristeza e em lamúrias simplesmente incompreensíveis ao resto do mundo, não demorou muito para que o despertador tocasse...



Créditos da imagem.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Toda história precisa de um 'meio' para ser completa...




O mais belo sonho não vale a pena ser sonhado se eternamente será somente ilusão... Como era previsível, um dia resolvi abri meus olhos, e mal pude crer que a realidade pudesse ser tão boa... Partindo inicialmente de um deserto onde a solidão se fazia companheira constante, e me ajudava a cravar novamente o racionalismo em minha mente na medida exata, pude então, logo abandonar minhas expectativas com relação ao pleno controle de meus sentimentos e perceber que naquele deserto nem todas as formas de vida estavam extintas... E me lembrar de que posso me esforçar ao máximo para 'domar' minha mente, mas sei que dificilmente conseguirei ter pleno controle de meu coração...
Levei anos para me convencer do contrário, no entanto, tenho motivos para crer que hoje, ele é mais sensato. Rendendo-me aos seus pedidos pude descobrir sentimentos sinceros de lealdade e afeto onde eu já esperava encontrá-los

Passei tanto tempo me preocupando em algo exato para dizer, que fosse realmente bom e desejei que superasse inclusive minhas próprias expectativas,
Creio não ter conseguido. Limito-me a agradecer, por todo o apoio, por todo o carinho e por toda a atenção que você tem me dado... Mesmo achando que não mereço a maravilhosa bênção que é te ter ao meu lado... Muito, muito obrigada...

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Começo e fim

Talvez há dois dias atrás ainda existisse alguma esperança...

Já cansada do clima eterno de despedidas, e conformada com o fato de que seu lar era o caminho entre uma cidade e outra, pegou a mala verde pela alça, e saiu em passos lentos, os olhos fixados em algo distante. Serena, esperava qualquer tipo de intervenção.
Como seria natural em tal situação, não demorou muito para que outras convidadas chegassem, e no início eram calmas, debulhavam sua expressão em um sorriso sincero de linhas muito finas, e escorriam pela pele excessivamente pálida, lugar de onde as cores e a saúde já haviam partido a muito tempo.
Não demorou muito para que o sorriso se fosse também. A boca, pequena, séria, se contorcia para não deixar sair nenhuma súplica. Ela já havia compreendido que a dor da saudade era um mal necessário e que logo mais seria curado.
Sentiu uma pontada muito forte na cabeça, que a fez parar. Colocou a mala ao lado dos pés, e baixou a cabeça, sentindo a despedida inevitável cada vez mais próxima. Procurou fugir, mas os pés já não a obedeciam. Neste momento, as ilustres convidadas pulavam exultantes de seus olhos, e escorriam trajadas de luto, tingidas pela maquiagem forte que usava.
De repente, seus olhos se fecharam, e ela não lembrou de mais nada.
Apenas imagens isoladas e que não faziam muito sentido vinham a sua mente...

O vestido longo e branco, as conversas, as discussões, as músicas escutadas e dançadas juntas, as cartas trocadas, aquelas que deveriam ser destruídas, tudo o que ela havia aprendido e ensinado...

Quando abriu os olhos, ainda não conseguia enxergar as coisas muito bem, mas a sensação desagradável foi passando ao longo de alguns minutos.

Acima de sua cabeça só via uma luz branca muito forte, e ao se virar, se deu conta de que estava em uma maca.

- Tudo bem? Já se sente melhor?- Perguntou afetuoso
- Não - Respondeu com a garganta entrecortada por suspiros e lágrimas - Eu disse que morreria de saudades. - Completou com um doce sorriso.
- Você é doida... - Respondeu também sorrindo e balançando a cabeça - Você conseguiu trazer as coisas que eu te pedi? - Perguntou receoso de estar exigindo dela mais do que deveria.
- Sim, está ali na mala - Disse se levantando e tentando sentar rápido demais, logo em seguida, caiu deitada novamente na maca - Nossa... Ai... O que aconteceu com minha cabeça? - Disse sentindo ainda um pouco de tontura
- Você desmaiou, esqueceu?- Disse olhando-a intensamente nos olhos
- Se não sabia como poderia esquecer? - Respondeu retribuindo o olhar
- Deixa, a mala está aqui, e eu também tenho que ir logo... Antes que você faça alguma besteira e eu desista. - Disse sorrindo
- Ah sim, e você realmente acha que eu seria capaz de uma coisa dessas? Que fofo. Quer um doce também, criança? – Respondeu pausadamente, fazendo referência a brincadeiras antigas dos dois.
- De preferência de laranja, você lembra? - Disse rindo alto
- Claro que sim - Respondeu rindo muito também.
- Tchau - Disse afagando-lhe o ombro direito - Não esqueça de me escrever
- Tchau - Ela disse colocando a mão no bolso do casaco - Não esquece nunca disso aqui - Disse lhe entregando um papel amassado e dobrado várias vezes

Fitou-a com carinho, fez um aceno de despedida e saiu.
No lado de fora da enfermaria, abriu o papel. Era uma foto que já tinha bem uns 3 anos...  Na imagem, duas mãos entrelaçadas que dançavam. A ponta de um belo vestido branco que parecia ter sido bordado à mão, e ao fundo, alguns vultos que pareciam também dançar. As mãos, encaixadas, pareciam ter sido feitas uma para a outra.
Deixando escapar apenas duas lágrimas com sabor de nostalgia, picou o papel em pedaços e atirou-os no lixo.
Do lado de dentro da enfermaria, a moça desorientada, com uma mancha roxa na testa, repetia sussurrando:

- Mais sete anos... Será que eu sobrevivo?

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Tentativa frustrada

     O dia estava sereno, os dois falavam baixo, mas a voz deles ainda era mais alta que o volume da televisão, o vento soprava relativamente forte do lado de fora, mas eles pareciam não ligar nem um pouco pra isso. Depois de algumas horas de conversa, o rapaz lentamente adormeceu. A moça então, pediu a mãe dele que lhe ajudasse a ajeitá-lo no sofá e assim fez, logo em seguida, empilhou os livros e os papéis ao lado da poltrona branca. Foi para a cozinha onde ela e a mãe dele tiveram uma conversa rápida. Saiu pela porta dos fundos que dava para o jardim, executou seu serviço, e então subiu rapidamente as escadas e se trancou no quarto do rapaz pelo lado de dentro.
Na maçaneta da porta ficaram os rastros do surto de raiva que muito provavelmente lhe traria conseqüências por longos anos...

     Atordoado, o rapaz acordou e estranhou o fato de estar muito bem acomodado no sofá. Procurou um relógio, mas não encontrou nada, se levantou e puxou a cortina, o sol já estava se pondo...
Olhou os livros empilhados agora em cima da poltrona, um papel amassado, com letras esparsas que pareciam ter sido escritas em meio a lágrimas diziam: "Acho que pode ser tarde demais". Ainda confuso, deixou o papel no lugar onde estava e ao se virar viu sua mãe, o rosto estava com feições duras, na mão segurava um pacote transparente com um vidro de soro fisiológico, bolotas de algodão brancas, e mais alguns aparatos para curativos. Coçou a barba rala sem entender e perguntou o que havia acontecido
- Suba - disse num tom de amor maternal
- O que foi? O que aconteceu? - Disse de forma pausada e calma
- Acho que não preciso pedir pra não fazer nenhuma besteira, confio em você - Entregou-lhe o pacote com as coisas e uma chave.

     Sem perguntar nada ele subiu os degraus lentamente, tentando lembrar o que havia acontecido. Aos poucos, trechos de imagens passavam em sua cabeça como em um filme. Sentia-se frustrado, ferido, e ao mesmo tempo preocupado e amedrontado.

     Viu um pouco de terra no chão próximo à porta e continuou sem entender absolutamente nada, fechou os olhos enquanto virava a chave e derrepente compreendeu tudo, correu em direção a cama, porém, procurou não fazer barulho. Ela estava sentada, com a coluna apoiada na cabeceira, olhando pela grande janela de vidro, as gotas pequenas da chuva fina que escorriam lentamente...

- O que você fez menina? - Perguntou apreensivo
- Dormi. - Respondeu sem olhar para ele
- Posso, é... Me... sentar?
- Claro - disse rindo: - Finja que o quarto é seu - Disse ainda sem olhar

Colocou o pacote de curativos em uma ponta da cama, e sentou-se ao lado, com muita cautela para não mover o colchão.

- Você está bem?
- Não sei - respondeu indiferentemente
- Você ainda não me disse o que fez, embora eu tenha alguma idéia
- Disse sim, eu dormi.
- Ah é? E sonhou? - falou como se conversasse com uma criança
- Sim.
- E como foi o sonho?
- Bonito.
- Pode olhar para mim, por favor?
- Posso...
- Então porque não o faz?
- Não tenho vontade

Ele levantou-se, ajoelhou-se diante dela, e tocou seu ombro, ela virou sorrindo insanamente.

- Você tem toda a razão - Ela disse com lágrimas nos olhos
- Sobre o que? - Perguntou apreensivo
- O pôr do sol aqui é lindo.
- Posso ver suas mãos?

O silêncio permaneceu por alguns segundos, rompido por passos na escada, ele levantou-se e trancou a porta, voltou a ajoelhar-se diante dela.

- Posso... Por... Por favor, ver suas mãos?
- Por que não - Esticou os braços, ele olhou abismado, abaixou a cabeça, pegou algumas bolotas de algodão e soro e começou a fazer o curativo.
- Andou brincando com alguma almofada de alfinetes é? - Disse rindo
- Não não, me feri nas suas ironias, seu imbecil - Disse sorrindo
- Pode me dizer o que realmente aconteceu? – Perguntou olhando-a diretamente nos olhos
- Só destruí aquele canteiro de rosas vermelhas do jardim. – Respondeu indiferente
- Posso saber por quê?
- Não gostei das flores, a cor delas dói. Me lembra aquelas flores que você me deu mês passado
- Não me admira que se pareçam, são as mesmas. – Respondeu um pouco irritado... Ela deu um longo suspiro, voltou a olhar a janela, mais uns dois minutos se passaram em um longo e torturante silêncio.

- Sua mãe não se chateou, ela queria me dar uma faca pra acabar com tudo de uma vez.
- Sorte sua, até semana passada aquele canteiro era o preferido dela.
- Ela disse que dá muito trabalho, não ia querer ninguém perdendo tempo regando aquilo.
- E seu sonho foi mesmo bonito?
- Foi... Descobri tanta coisa...

Neste momento ele terminava o curativo da mão direita, dava um beijo de leve nela, e se sentava ao lado da garota que recostava a cabeça em seu peito.

- Me conte tudo - Disse cheio de afetividade
- Foi estranho... sabe? No sonho eu olhava no espelho, eu vi que meus olhos eram bonitos.
- E realmente são muito lindos.
- E quando o sol batia no meu rosto, eles ficavam um pouco mais claros...
- Menos confusos? - Ele disse tentando compreender
- Exatamente isso. - Disse se desencostando do seu peito para fitá-lo : Já teve um sonho assim?
- Não - Ele respondeu triste - Mas gosto de ver seus olhos.

A garota voltou a colocar a cabeça no peito dele, confusa. Mas queria aproveitar seus doces segundos de paz. Ele se virou, olhou-a nos olhos, deu-lhe um beijo na testa e disse:

- Eu gosto muito de seus olhos... Mas eles eram ainda mais bonitos quando você enxergava...

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Alterações

Olá pessoal do Jabuty!
Venho comunicar-lhes que o blog passará por algumas mudanças...

Consegui adicionar uma página só para os contos (ahh... sou ninja o/ rs) o que vai deixar o blog mais organizado, então as postagens que vinham junto com os extos 'Epitáfio' foram editadas.
Para minha alegria, Me lembrei que acabei de excluir a segunda parte de 'Epitáfio' e que provavelmente não exista uma cópia. Se eu tiver de reescrever acredito que não sairá igual ao original, portanto, se alguém leu e notar diferença já tá explicado o porque... (sou ninja baby.)

Acho que em breve estaremos de layout novo o/

Dicas de leitura: Bolo com Membros | Utopia

Beijos :*


13/04/10
O layout já foi alterado, mas eu nãão gosteii =/

quinta-feira, 13 de maio de 2010

"Jardim de inverno"


Eu relutei em acreditar quando vi uma flor vermelha crescendo no jardim. Fiquei por horas observando-a sem saber ao certo o que fazer. Com a ponta dos dedos, toquei de leve suas pétalas macias, mas recuei pelo medo de me ferir novamente nos espinhos.
Ah os espinhos! Quem poderia imaginar algo como isso? Estão de volta!
E eu que acreditei inocentemente na minha teoria de que uma consciência supostamente amorfinada poderia acabar com facilidade com qualquer tipo de vida naquele lugar que até então era só meu... Todas as flores secavam antes de terem cor em suas primeiras pétalas... E os espinhos cresceram de novo! Malditos espinhos. Alguém tire-os daqui por favor?
Como sinal de uma nova estação qualquer jardim no mundo se reveste de novas cores, com seu estilo próprio de conquistar a atenção de quem o observa. Os aromas adocicados das flores trazem visitantes agradáveis como borboletas e pássaros... Eu vejo um pequeno milagre se realizar todos os dias quando com cuidado separo para o plantio sementes de gérberas brancas, e no fim de algumas horas avisto um belo canteiro repleto de rosas vermelhas. Antes de tudo a surpresa, e só então a alegria...

Somente lamento que meu egoísmo e minha falta de esperança tenham trazido esses espinhos novamente... Por favor, me ajude a enterrá-los para sempre.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Inconcebivelmente Inevitável

Aquela despedida foi como qualquer outra seria. Ou pelo menos como eu imaginava que fosse. Abraços, pedidos de desculpas regados a lágrimas e tudo mais que o momento pedia. Era mais um dia a ser vivido, mais um caminho a se percorrido e estávamos dispostos a tudo mais que fosse necessário para que aquele momento fosse tão esclarecedor para ambos quanto fosse possível.

Eu de cabeça baixa, cuspia toda a tristeza e pedia incessantemente que ele fosse capaz de me perdoar por toda aquela vida de erros. Sentados ali, olhando as ondas pequenas que o vento fazia na água, evitando ao máximo os olhos um do outro, nos lembramos do início de tudo.
Das brincadeiras bobas, dos passeios no parque nos finais de semana, das cartas, das confidências. Do dia em que fomos apresentados formalmente à família um do outro, daquele passado tão livre e sem sentido, que não trazia agora nem serenidade.

Alguns minutos se passaram com olhares silenciosos, enquanto eu descrevia meu crime e aguardava minha sentença.

Passei os dedos na gola de sua camisa, tomei coragem para olhar em seus olhos pela primeira vez, e após tudo, pedi desculpas.
Ele então, colocou o rosto próximo do meu pela primeira vez desde que chegamos ali e pediu que me calasse.

- Mas... Eu não poderia deixar tudo terminar assim sem te dizer, sem, sem te pedir que me perdoasse. - Eu dizia em tom de desespero, puxando cada vez mais a gola da camisa, numa tentativa inútil de me prender a uma esperança que já estava sepultada a anos.
- Mas você não tem culpa. - Respondeu indiferentemente.
- E como não? Eu entendo o que você fez. Sei que não foi bem vingança.. Eu mereci. - As lágrimas indiscretas entravam em cena, e ele também chorava.
- Tanto faz. Você sempre soube que a culpa não era só sua.
- Ainda assim... Me perdoa?

Os segundos se arrastaram enquanto eu lutava para não sair correndo dali. Minha mão agora puxava a gola da camisa dele com a força e o desespero de quem exige uma resposta rápida. Ainda assim ele me olhava suplicante, sem dizer absolutamente nada. Virou o rosto para o lado para não ter de me encarar.
Inconscientemente soltei a mão de sua camisa e passei a fitar o chão

- Me... Me perdoa? - Eu perguntei com a voz trêmula, olhos fechados, esperando um não e qualquer reação violenta.
Talvez mais um minuto houvesse se passado, mas toda aquela aflição fazia com que poucos segundos parecessem horas. Até que ele se virou, colocou a mão em meu ombro, olhou em meus olhos, respirou devagar e perguntou-me:

- Você vai ficar bem?
Sorri lentamente, tentando afastar a letargia que tomava meu corpo. Mais umas duas ou três lágrimas escorreram vagarosas procurando seu rumo, demorando-se muito logo abaixo de meus olhos. Eu as enxuguei uma por uma e por fim, respondi:

- Não.